by - 08:33


Cresce busca por serviços de apoio a refugiados em Campinas

A cifra de pessoas refugiadas ao redor do mundo chegou a 25,4 milhões, até junho deste ano, de acordo com o escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR). No Brasil, houve um aumento de 161% do número de solicitações de refúgio no primeiro quadrimestre deste ano, em comparação com o mesmo período no ano anterior, segundo dados obtidos pela GloboNews junto ao Ministério da Justiça por meio da Lei de Acesso à Informação. Três quartos dessas solicitações vieram de venezuelanos.
A solicitação de refúgio é uma forma de garantir o acesso a direitos fundamentais à pessoa que teve que fugir de seu país por ter sofrido violações graves de direitos humanos ou perseguição por motivos políticos, sociais, de nacionalidade, raça ou religião. De 2000 a 2016, segundo o Observatório das Migrações em São Paulo, na cidade de Campinas residiam 43 pessoas nessa condição. Com o agravamento da crise na Síria e na Venezuela, o mais provável é que essa cifra tenha aumentado.

Serviço de apoio municipal

O Serviço de Referência ao Imigrante, Refugiado e Apátrida da Prefeitura de Campinas foi criado em 2016, vinculado ao Departamento de Direitos Humanos da Secretaria Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência e Cidadania. É o órgão responsável por acolher e encaminhar aqueles que chegam ao município nessas condições, facilitando o acesso às políticas públicas. 
“A demanda aumentou muito nesse segundo semestre, absurdamente” conta Maria Valéria Scatolini Hernandez, psicóloga que atende no plantão do serviço. Este ano, cerca de 70 pessoas foram atendidas por mês entre junho e agosto. O número pode parecer baixo, mas representa um crescimento de mais de 400% em relação ao ano passado. De fato, conforme informações do portal G1, em 2017 o Serviço recebia em média 15 pessoas por mês, entre imigrantes, refugiados e solicitantes de refúgio.
A equipe do Serviço de Referência se resume a um par de funcionários. Maria Hernandez e o também psicólogo Dorival Guilherme desenvolvem ações de diversas naturezas a partir de parcerias e articulações com outros órgãos. Entre essas ações, estão a orientação e o acompanhamento para regularização da documentação; o encaminhamento para o acesso a programas sociais, como o Bolsa Família e a solicitação de abrigo junto ao Serviço de Apoio ao Migrante, Itinerante e Mendicante (SAMIM). Também é indicado o suporte jurídico oferecido por sindicatos, Defensoria Pública e delegacia de polícia para casos de exploração do trabalho, xenofobia e discriminação.
Em relação ao acesso a trabalho e renda, os imigrantes e refugiados são encaminhados ao Centro Público de Apoio ao Trabalhador (CPAT) assim como a instituições que oferecem capacitação profissional, como o SENAC e o CEPROCAMP. O ensino de língua portuguesa para estrangeiros tem sido viabilizado por meio de parcerias com a FUMEC, o SESC e um grupo voluntário de alunos da UNICAMP.
A sensibilização da opinião pública, assim como de instituições e empresas, é outra frente de ação do Serviço de Referência. Nesse âmbito, têm sido articuladas palestras em escolas, o suporte para exposições e eventos culturais diversos sobre a temática da imigração e do refúgio, assim como a sensibilização de empresas para a contratação de mão de obra imigrante. A interlocução com outros serviços da rede pública tem buscado facilitar as relações e o acolhimento dessas pessoas no que toca às dificuldades relativas ao idioma e às diversidades culturais.
O Serviço ainda está em interlocução com duas outras iniciativas de apoio às pessoas nessas condições que chegam à cidade de Campinas. A primeira delas, a Rede de Apoio ao Imigrante e Refugiado (RAIR), constituída por pessoas físicas, entidades civis e religiosas, surgiu em 2016 a partir de um fórum para discussão do fluxo migratório no município e da capacitação oferecida pelo próprio Serviço. Segundo Maria Hernandez, a Rede ainda está em processo de formalização por meio da constituição de um estatuto. A outra iniciativa de apoio está vinculada à Unicamp, a quem os dados colhidos pelo Serviço durante os atendimentos são repassados para subsidiar o desenvolvimento de pesquisas para a implantação de políticas públicas.

O papel da Universidade Estadual de Campinas

Em outubro do ano passado, a Unicamp oficializou sua adesão à Cátedra Sérgio Vieira de Mello, criada pelo ACNUR em 2003. Na mesma ocasião, aderiu ao Pacto Nacional Universitário pela Promoção do Respeito à Diversidade e da Cultura de Paz e Direitos Humanos, idealizado pelos Ministérios da Educação, da Justiça e Cidadania. Desde então, a universidade vem não só ampliando a produção científica e o oferecimento de disciplinas a respeito do tema, mas também, em parceria com a Prefeitura de Campinas, o ACNUR-Brasil e o Governo Federal, oferecem capacitação aos agentes envolvidos na recepção dos refugiados.
O ensino da língua portuguesa a estrangeiros foi crucial no início desta década, com a chegada dos estudantes haitianos, conta a professora Néri de Barros Almeida, coordenadora do Comitê Gestor do Pacto Nacional Universitário pela Promoção do Respeito à Diversidade e da Cultura de Paz e Direitos Humanos. No entanto, com a adesão à Cátedra, a Universidade tem oferecido o ensino da língua não apenas para alunos, mas também para imigrantes e refugiados.
Além de facilitar a validação de títulos de graduação e pós-graduação dessas pessoas, outra medida adotada pela instituição face ao cenário atual é facilitar o acesso de refugiados a vagas de estudo na graduação e pós-graduação da universidade, desde que os solicitantes tenham sido reconhecidos pelo Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE).

Defasagem do Serviço Municipal

Uma parceria com representantes de Brasília e do ACNUR, envolvidos diretamente com o processo de acolhimento de venezuelanos, não pode ser firmada pelo fato de Campinas ainda não contar com um abrigo emergencial adequado a essas situações, posto que as instalações do SAMIM (Serviço de Apoio ao Migrante, Itinerante e Mendicante) são originalmente voltadas à outra população, onde a permanência é de curto período.
A disponibilização de um novo abrigo municipal é uma demanda recorrente, especialmente, por haitianos que, segundo Maria Hernández, “agora estão com dificuldade, devido à crise e o desemprego, de manter o aluguel”. A instalação, já com local definido, estaria em andamento, ainda que sem data prevista de conclusão. Mesmo assim, a inauguração do novo abrigo não significa que o município fará uma parceria para o acolhimento de refugiados da Venezuela, explica a psicóloga. 
  Por fim, outra insuficiência apontada por Maria Hernández se refere ao quadro de funcionários do Serviço. Atualmente o plantão de atendimento e acolhimento é realizado apenas pelos dois psicólogos. “Precisamos de um ou dois assistentes sociais”, revela, diante do aumento da demanda. “Estamos aguardando a chegada de alguns estagiários na área vindos pelo programa da prefeitura”, viabilizado através do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE).

*Por Danilo Mendes Piaia, aluno de Estudos Literários do IEL/Unicamp

You May Also Like

0 comentários