Cresce busca por
serviços de apoio a refugiados em Campinas
A cifra de pessoas refugiadas
ao redor do mundo chegou a 25,4 milhões, até junho deste ano, de acordo com o
escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR). No
Brasil, houve um aumento de 161% do número de solicitações de refúgio no
primeiro quadrimestre deste ano, em comparação com o mesmo período no ano
anterior, segundo dados obtidos pela GloboNews junto ao Ministério da Justiça
por meio da Lei de Acesso à Informação. Três quartos dessas solicitações vieram
de venezuelanos.
A solicitação de refúgio é
uma forma de garantir o acesso a direitos fundamentais à pessoa que teve que
fugir de seu país por ter sofrido violações graves de direitos humanos ou
perseguição por motivos políticos, sociais, de nacionalidade, raça ou religião.
De 2000 a 2016, segundo o Observatório das Migrações em São Paulo, na cidade de
Campinas residiam 43 pessoas nessa condição. Com o
agravamento da crise na Síria e na Venezuela, o mais provável é que essa cifra
tenha aumentado.
Serviço de
apoio municipal
O Serviço de Referência ao
Imigrante, Refugiado e Apátrida da Prefeitura de Campinas foi criado em 2016,
vinculado ao Departamento de Direitos Humanos da Secretaria Municipal dos
Direitos da Pessoa com Deficiência e Cidadania. É o órgão responsável por acolher
e encaminhar aqueles que chegam ao município nessas condições, facilitando o
acesso às políticas públicas.
“A
demanda aumentou muito nesse segundo semestre, absurdamente” conta Maria Valéria Scatolini
Hernandez, psicóloga que atende no plantão do serviço. Este ano, cerca de 70
pessoas foram atendidas por mês entre junho e agosto. O número pode parecer
baixo, mas representa um crescimento de mais de 400% em relação ao ano passado.
De fato, conforme informações do portal G1, em 2017 o Serviço recebia em média
15 pessoas por mês, entre imigrantes, refugiados e solicitantes de refúgio.
A equipe do Serviço de Referência se
resume a um par de funcionários. Maria Hernandez e o também psicólogo Dorival
Guilherme desenvolvem ações de diversas naturezas a
partir de parcerias e articulações com outros órgãos. Entre essas ações, estão
a orientação e o acompanhamento para regularização da documentação; o
encaminhamento para o acesso a programas sociais, como o Bolsa Família e a
solicitação de abrigo junto ao Serviço de Apoio ao Migrante, Itinerante e
Mendicante (SAMIM). Também é indicado o suporte jurídico oferecido por sindicatos, Defensoria Pública e delegacia de polícia para
casos de exploração do trabalho, xenofobia e discriminação.
Em relação ao acesso a
trabalho e renda, os imigrantes e refugiados são encaminhados ao Centro Público
de Apoio ao Trabalhador (CPAT) assim como a instituições que oferecem
capacitação profissional, como o SENAC e o CEPROCAMP. O ensino de língua
portuguesa para estrangeiros tem sido viabilizado por meio de parcerias com a
FUMEC, o SESC e um grupo
voluntário de alunos da UNICAMP.
A sensibilização da opinião
pública, assim como de instituições e empresas, é outra frente de ação do
Serviço de Referência. Nesse âmbito, têm sido articuladas palestras em escolas,
o suporte para exposições e eventos culturais diversos sobre a temática da
imigração e do refúgio, assim como a sensibilização de empresas para a
contratação de mão de obra imigrante. A interlocução com outros serviços da
rede pública tem buscado facilitar as relações e o acolhimento dessas pessoas
no que toca às dificuldades relativas ao idioma e às diversidades culturais.
O Serviço ainda está em
interlocução com duas outras iniciativas de apoio às pessoas nessas condições
que chegam à cidade de Campinas. A primeira delas, a Rede de Apoio ao Imigrante
e Refugiado (RAIR), constituída por pessoas físicas, entidades civis e
religiosas, surgiu em 2016 a partir de um fórum para discussão do fluxo
migratório no município e da capacitação oferecida pelo próprio Serviço. Segundo Maria
Hernandez, a Rede ainda está em processo de
formalização por meio da constituição de um estatuto. A outra iniciativa de
apoio está vinculada à Unicamp, a quem os dados colhidos pelo Serviço durante
os atendimentos são repassados para subsidiar o desenvolvimento de pesquisas
para a implantação de políticas públicas.
O papel da
Universidade Estadual de Campinas
Em outubro do ano passado, a
Unicamp oficializou sua adesão à Cátedra Sérgio Vieira de Mello, criada pelo
ACNUR em 2003. Na mesma ocasião, aderiu ao Pacto Nacional Universitário pela
Promoção do Respeito à Diversidade e da Cultura de Paz e Direitos Humanos,
idealizado pelos Ministérios da Educação, da Justiça e Cidadania. Desde então, a
universidade vem não só ampliando a produção científica e o oferecimento de
disciplinas a respeito do tema, mas também, em parceria com a Prefeitura de
Campinas, o ACNUR-Brasil e o Governo Federal, oferecem capacitação aos agentes
envolvidos na recepção dos refugiados.
O ensino da língua portuguesa a
estrangeiros foi crucial no início desta década, com a chegada dos estudantes
haitianos, conta a professora Néri de Barros Almeida, coordenadora do Comitê
Gestor do Pacto Nacional Universitário pela Promoção do Respeito à Diversidade
e da Cultura de Paz e Direitos Humanos. No entanto, com a adesão à Cátedra, a
Universidade tem oferecido o ensino da língua não apenas para alunos, mas
também para imigrantes e refugiados.
Além de facilitar a validação de títulos
de graduação e pós-graduação dessas pessoas, outra medida adotada pela
instituição face ao cenário atual é facilitar o
acesso de refugiados a vagas de estudo na graduação e pós-graduação da
universidade, desde que os solicitantes tenham sido reconhecidos pelo Comitê
Nacional para os Refugiados (CONARE).
Defasagem do Serviço Municipal
Uma parceria com representantes de Brasília e do
ACNUR, envolvidos diretamente com o processo de acolhimento de venezuelanos,
não pode ser firmada pelo fato de Campinas ainda não contar com um abrigo
emergencial adequado a essas situações, posto que as instalações do SAMIM
(Serviço de Apoio ao Migrante, Itinerante e Mendicante) são originalmente
voltadas à outra população, onde a permanência é de curto período.
A disponibilização de um novo
abrigo municipal é uma demanda recorrente, especialmente, por haitianos que,
segundo Maria Hernández, “agora estão com dificuldade, devido
à crise e o desemprego, de manter o aluguel”. A instalação, já com local
definido, estaria em andamento, ainda que sem data prevista de conclusão. Mesmo
assim, a inauguração do novo abrigo não significa que o município fará uma
parceria para o acolhimento de refugiados da Venezuela, explica a psicóloga.
Por fim,
outra insuficiência apontada por Maria Hernández se refere ao quadro de
funcionários do Serviço. Atualmente o plantão de atendimento e acolhimento é
realizado apenas
pelos dois psicólogos. “Precisamos de um ou dois assistentes sociais”, revela,
diante do aumento da demanda. “Estamos aguardando a chegada de alguns
estagiários na área vindos pelo programa da prefeitura”, viabilizado através do
Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE).
*Por Danilo Mendes Piaia, aluno de Estudos Literários do IEL/Unicamp